No livro O Pobre de Direita, Jessé Souza oferece uma análise surpreendente ao defender que o racismo, mais do que as questões econômicas ou os valores tradicionais, é o principal motor por trás da ascensão da extrema direita no Brasil. Essa interpretação inédita chama a atenção ao examinar um fenômeno recente e profundo: o aumento expressivo do apoio popular a uma política conservadora, que emergiu com força a partir das eleições de 2018, transformando a cena política brasileira.
Para entender esse cenário, é essencial considerar o contexto sociopolítico em que vive o brasileiro. Nas últimas décadas, as classes mais empobrecidas experimentaram algumas melhorias em suas condições de vida, especialmente durante os anos de políticas sociais mais amplas. Contudo, o apoio de grande parte dessas mesmas classes à extrema direita, que propõe o desmonte de muitas dessas conquistas, levanta questões inquietantes. Por que tantos brasileiros mais pobres passaram a apoiar uma agenda política que, ao fim, parece trabalhar contra seus próprios interesses, retirando direitos e desmantelando políticas públicas que lhes beneficiavam?
Jessé Souza encontra parte da resposta ao focar em dois grupos específicos: o branco pobre e o negro evangélico. Ambos representam facetas diferentes, mas complementares, dessa nova realidade política. Ao explorar as demandas de indivíduos desses grupos, Souza revela um cenário onde o racismo não apenas permeia o discurso dos mais favorecidos, como também é absorvido pelas camadas populares, muitas vezes influenciadas pelo crescente poder das igrejas evangélicas. Essas igrejas, que têm um peso considerável na formação da identidade política de milhões de brasileiros, frequentemente se alinham a discursos conservadores, enfatizando valores morais que reforçam divisões e preconceitos.
O autor ainda destaca como o conservadorismo moral, que ganhou força nas regiões Sul e Sudeste, onde a maioria populacional é branca, foi aos poucos sendo absorvido também pela população racializada, criando uma aliança paradoxal entre segmentos que deveriam, em tese, estar em oposição. Essa estranha sintonia entre a classe média branca e os pobres racializados ecoa a ideia de uma “vingança dos bastardos”, termo que Souza usa para descrever o ressentimento acumulado por aqueles que, historicamente, foram marginalizados e que agora se sentem traídos pelas promessas de um Brasil mais justo e igualitário.
A análise de Jessé Souza se revela crucial para compreender como o Brasil chegou a um ponto onde uma parte significativa da população vê na extrema direita uma resposta para seus anseios. Ao nos debruçarmos sobre as interseções de raça, religião, e ressentimento social, o sociólogo propõe uma reflexão essencial para entender como essas dinâmicas afetam o tecido social brasileiro e alimentam o atual conservadorismo que molda o futuro do país.